domingo, 12 de janeiro de 2014

O VÍCIO DE SE DEIXAR GUIAR POR UM PADRÃO

Observando com demora reparei que é uma ilusão pensar que haja algo que não possa ser lido, que fique escondido ou que não se possa ver. Que bom que é assim! Há muito a que ser visto! 
O que parece ocorrer em maioria é não saber, ou não querer ler. Bem que se disse: Conhecimento e interesse andam juntos, um não vive sem o outro. 
Sei que muitos são os leitores que não têm interesse em ler, muitos não gostam, nem têm vontade. Há os que não sabem, e nem se esforçam por saber. Tem também os que tropeçam no engano e se acomodam; e os que simplificam, julgando otimizar a leitura, nocivamente configuram um padrão. 
Os modos condicionados das 'leituras dinâmicas' adestram o olhar para uma percepção estreita, prendendo num lugar de repetições. Já falei muitas vezes que nesse lugar não quero ir, nem tampouco ficar, só de imaginar me causa arrepios e aversão.
Há os que veem com os olhos dos outros, repetem o vivido de alguém. Ilusão de possuir. Estes restringem a própria liberdade.
De modo semelhante fazem assim os que prenderam pessoas dentro de si, ou ataram-se a elas de tal jeito, com correntes pesadas, que todas as outras que passam ou ficam em sua vida são percebidas por um mesmo olhar. O interesse fica algemado ao desejo de perpetuar a identidade do que o rejeitou. Ler alguém a partir de quem já se foi força o outro a ser quem não é, cria simulacro. Esse olhar tira o valor, pois desmaterializa o que está no agora, rouba-lhe a liberdade do vir a ser o que se é, em nome do culto ao que já não está mais ali, forja a forma do que veio antes no que anseia por saber quem é. 
Para se saber quem é o olhar do outro não é suficiente. Conforme o olhar pode condicionar no engano, pois todos têm suas lembranças, e há os que não se desfazem dos sentimentos que elas trazem consigo. Aproveitar sentimentos gerados para 'Um', reciclado-os para direcioná-los a outro 'Um', só pode produzir ressentimento.
Infelizmente, muitos dos que estão expostos a esse tipo de vista persuasiva e insistente se perdem de si. Por certo é um caminho de morte.
Lembrei também do míope, precisa da lente de vidro e a dioptria estabelece seu padrão. A partir desse ponto, com a lente de vidro (que não nasceu no olho) cria dependência, e na falta dela só vê borrões. Não consegue ver per si. Lentes de vidro são frágeis, e por estar fora do corpo ficam ainda mais expostas e suscetíveis a serem esquecidas. Lentes de vidro não tem pálpebras.
Lamento pelos que não sabem que pessoas não se repetem. Pessoa se pode ler, ler muito, ler mais e ainda ler, e as páginas não se findam, não se esgotam. 
Hoje penso que ler pessoas pode ser inefavelmente mais rico a que ler livros. Nas pessoas não se pode voltar as páginas. Nas pessoas nem sempre há sequência, as páginas podem vir com saltos. Como são dinâmicas!
A pouco não pensava assim, provavelmente porque os livros são cheios de ordem e coerência, além do mais não resmungam, não criticam, tampouco são violentos. Seu comportamento já é o esperado, sem surpresas se sabe como irão se mostrar: maleáveis, se deixam abrir, permitem que os manipule, não se magoam se forem postos de lado, podem ser lidos quando surgir a vontade.
Dei-me conta de que já gostava dos livros que contam sobre pessoas, com esses que mais me detinha, conversando sem pressa, conversas demoradas, longas e cheias de vigor, com sotaques variados.
Nesse tempo, que pensava que livros fossem melhores companhias a que pessoas, achava equivocadamente que o projeto do Ser Humano não havia dado certo, parecia, no meu olhar míope, uma aporia desvalida. Esse tempo foi de não querer saber ler se não pelas letras.
Ao despertar uma boa vontade, passei a buscar um outro caminho, que desembocava na percepção da intuição, um outro tipo de alfabeto. Esse fez alongar a vista para além das letras, trazendo entendimento. O entendimento não justifica, mas faz saber um porquê. Volta o olhar para a causa e faz nascer e crescer a compaixão. Ajuda a achar os pares.
Lembrei-me do que um dos alemães que gastam a vida a pensar, e que pensam por muitos, escreveu sobre um algo que ele chamou de "não sei quê".

"Essas pequenas percepções, devido às suas consequências, são por conseguinte mais eficazes do que se pensa. São elas que formam esse não sei quê, esses gostos, essas imagens das qualidades dos sentidos, claras no conjunto, porém confusas nas suas partes individuais, essas impressões que os corpos circunstantes produzem em nós, que envolvem o infinito, esta ligação que cada ser possui com todo o resto do universo."

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